A Última Dor (microconto)
─ Lastimável. Sua situação é lastimável.
Olhou para os trapos de roupa que ainda cobriam aquele corpo frio e não obteve resposta. Apenas o silêncio presente naquela imensidão, seguida por um vento gelado de inverno.
Ela olhou para o corpo. Respirou fundo e limpou o sangue. Não sabia dizer por qual motivo o fazia, mas achava que se livrar dele limpo era mais digno. Ela suportara aquele peso até o topo do desfiladeiro com um objetivo: dar um fim àquela aflição sem deixar rastros.
Como ela pôde se deixar levar tão facilmente por aquele olhar? Se apaixonar por alguém que nunca quis realmente colocá-la em primeiro lugar? Se entregar a ponto de ter sua vida destruída?
Agora, deixava tudo para trás. Finalmente resolveu agir e cortar o mal pela raíz. Nunca mais deixaria que ninguém fizesse com que ela não se sentisse importante. Ou melhor: não seria idiota nem mais uma vez.
Por um momento, sua consciência oscilou e ela pensou em desistir, mas não podia. Por mais difícil que fosse, já tinha tomado a decisão lá atrás naquele banheiro sujo. Quando agiu por impulso percebendo que a culpa era só sua e de mais ninguém.
Terminou de limpar o sangue dos arranhões que se acumularam no caminho, causados pelos galhos daquela mata densa. Era a hora. Arrastou o corpo pesado até a beira do desfiladeiro e apreciou as pedras que deslizaram pelo infinito abaixo de seus pés. Uma vertigem tomou conta de si e seus olhos arderam com a dor que invadiu seu peito e se espalhou por sua alma, mas aquela era a última vez.
A última dor.
O que ela não sabia era que nada doía mais do que vingar-se de si mesma. E, quando se deu conta disso, pulou.
One Comment
Thais Helena Ferreira Benetti
Nss,forte,triste,deu dó 🙁